Belo Horizonte, 03 de dezembro de 2023.
Querido Mundo,
Há algum tempo venho pensando em escrever para você. Abrir meu coração, dizer o que se passa dentro dele. Espero que me compreenda, me ajude a entender o que também se passa com você.
O que aconteceu? Tenho te achado um tanto quanto estranho. Te vejo nos noticiários, nas ruas, no consultório. Lá, então, entre quatro paredes e o reforço de uma porta dupla acústica, você tem surgido bem machucado pra mim: doído, decepcionado, perplexo, fragmentado, adoecido; triste, exausto, banalizado, ansioso, com falta de ar e sem dormir. Tem dias que você chega de perna bamba e taquicardia sem que isso signifique necessariamente paixão, essa palavra que tanto me move. Você chega a desfalecer diante de mim.
Tenho escutado algumas coisas preocupantes a seu respeito: “O mundo está perdido.” “Que loucura.” “Onde esse mundo vai parar?” “Para esse ônibus que eu quero descer.” “O mundo vai acabar. “Meu mundo acabou.”
Às vezes tenho a sensação de que andam maltratando você; que o ar que a gente respira anda denso; que um dia você ainda vai explodir, sumir do mapa, deixar de existir. Pessoas brigando e matando no trânsito, cada vez mais caótico. Racismo. Violência. Xenofobia. Manchetes e mais manchetes rodopiando no celular, sem cessar. É tanta notícia ruim que eu já perdi a conta, não sei como você dá conta. Minas negligentes afundando gente. Gente perdendo casa, perdendo sonhos, perdendo uma vida inteira. Gente deixando de ser gente – se desumanizando bem ali à nossa frente. Gente escorregando na gravata e na própria língua, dando nó na cabeça da gente. Gente desdenhando de gente. Gente importante, de uma responsabilidade imensa, pronunciando graves equívocos a partir de um conflito que anda aterrorizando o mundo. O que aconteceu, minha gente?!
E aí eu abro um capítulo, um parágrafo dos mais tristes e tenebrosos para falar do pesadelo que você anda vivendo. Sim. Não, não é possível. Vi com os olhos atônitos e encharcados que em uma antiga terra sagrada o amor foi pisoteado pelo terror. Terror. E a partir daí fiquei olhando catatônica para você, tentando catar os cacos, tentando inutilmente te entender. Em pleno século vinte e um, Mundo?! Depois de tanta dor, tanto sofrimento, tantas atrocidades já vividas?!
Mais uma vez sequestraram o sol, apagaram a luz, apagaram vidas. Surto. Susto. Escuridão. Onde foi parar a paz? Onde jaz?
Responde, Mundo. Não fique mudo, pelo amor de Deus.
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